A jornada dos geoparques da região até a certificação da Unesco


Um território que há 230 milhões de anos havia servido de lar para as mais variadas formas de vida animal, vegetal e formações rochosas sedimentares marinhas e continentais. A beleza da biodiversidade deste pedaço da Região Central do Estado é única. Hoje, o local, conhecido como Geoparque Quarta Colônia, abriga nas rochas, fósseis Triássicos de grande relevância científica, dos dinossauros mais antigos da Terra, além de valorizar a memória dos povos que construíram o espaço. 


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A cerca de 128 quilômetros (km) da Quarta Colônia, está "o lugar onde a floresta termina", segundo o povo guarani, e começa o pampa. O município de Caçapava do Sul é marcado pelo mistério do sobrenatural e paisagens exuberantes de formações geológicas, como o geossítio Guaritas, de 500 a 600 milhões de anos. Por terem essas duas características únicas no mundo, os geoparques Quarta Colônia e Caçapava do Sul foram reconhecidos pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).


Em dezembro de 2022, em uma reunião da Unesco, os geoparques Quarta Colônia e Caçapava receberam sinal verde. Os relatórios foram realizados pelos avaliadores Ángel Hernandéz (Espanha) e Helga Chulepin (Uruguai), que participaram da missão na Quarta Colônia, e de Antonino Matencio (Espanha) e Mahito Watabane (Japão), avaliadores do geoparque Caçapava. Os documentos resultaram na indicação positiva e recomendação de aprovação de ambos territórios como geoparques mundiais.


A oficialização dos geoparques mundiais ocorre neste sábado em um evento Marrakech, no Marrocos. Mas, o processo de construção dos geoparques não foi simples, muitas pessoas se envolveram para os locais conseguirem chegar a essa conquista e a esse título que ambos têm hoje.



A gestação do Geoparque Quarta Colônia 

Avaliadores da Unesco vieram conhecer os geossítios da Quarta Colônia em 2022Foto: Nathália Schneider (Diário/Arquivo)


O território integra nove municípios: Agudo, Dona Francisca, Faxinal do Soturno, Nova Palma, Ivorá, São João do Polêsine, Pinhal Grande, Restinga Sêca e Silveira Martins. Os locais são berços da comunidade italiana, alemã e quilombola, que levam na cultura as tradições e costumes dos antepassados. "Entre fósseis, trilhas e mirantes, entre casarões coloniais, mesa farta e memórias, o tempo se faz paisagem, e o espaço é um convite à descoberta", como descreve o dossiê enviado à Unesco, em 2021. 


Desde 1996, os nove municípios deste território se uniram para criar o Consórcio de Desenvolvimento Sustentável da Quarta Colônia (Condesus), para homenagear e manter a memória dos antepassados, além de preservar a biodiversidade que envolve os ecossistemas de florestas e de campos. 


Em 2019, a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) somou-se ao trabalho que até então o Condesus realizava, desde 2012. Conforme a pró-reitora Adjunta de Extensão da UFSM e diretora do Quarta Colônia Geoparque Mundial da Unesco, Jaciele Sell, a universidade atuava há muitos anos na região, contudo, sempre de forma individual. 


— A partir de 2019 a ideia de Geoparque Quarta Colônia se torna um projeto institucional da UFSM, uma estratégia para o desenvolvimento regional, e aí ganha corpo e fomento específico. Deixa de ser o projeto de um outro pesquisador, e passa a ser de toda UFSM. Até hoje já foram desenvolvidos mais de 100 projetos de mais de 20 áreas de conhecimento diferentes — explica a diretora. 


Cronologia 

  • 2008 - Contratação do Serviço Geológico do Brasil para a realização do inventário geológico 
  • 2010 - Publicação do inventário do Projeto Geoparque Quarta Colônia
  • 2015 - Início das atividades científicas do Centro de Apoio à Pesquisa Paleontológica (Cappa)
  • 2016 - Revisão e avaliação e do inventário geopatrimonial 
  • 2019 - Projeto Geoparque Quarta Colônia se transforma em projeto estratégico da PRE/UFSM
  • 2020 - Envio da carta de intenções à UNESCO
  • 2021 - Submissão do Dossiê de candidatura a Geoparque Mundial da Unesco 
  • 2022 - Avaliação feita por integrantes da Unesco, que vieram conhecer todos os geossítios do geoparque Quarta Colônia
  • 2023 - Certificação como Geoparque Mundial da UNESCO



Como nasceu o Geoparque Caçapava do Sul 

Visita dos avaliadores da Unesco ao Geoparque CaçapavaFoto: Nathália Schneider (Diário/ Arquivo)


O município de Caçapava do Sul é um cartão postal de formações rochosas e de uma fauna única. Conforme dossiê elaborado para conquistar a alcunha de geoparque, é um território  onde "o tempo da terra e o tempo da humanidade se encontram e se misturam para celebrar a herança daquilo que recebemos, olhando para o presente, com conhecimento do passado e planejando o futuro".


Para completar o cartão postal, está a presença dos sedimentos de seus arroios, fósseis de animais extintos da megafauna, em especial as preguiças-gigantes. Espécies vegetais raras e endêmicas do bioma pampa, além de comunidades humanas tradicionais, como indígenas, quilombolas e pecuaristas familiares. 



Os primeiros estudos de patrimônio natural e cultural, com foco na geodiversidade, começaram em 2010, em um projeto de pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Cnpq) liderado pelo geólogo André Borba, atual coordenador científico do Geoparque Caçapava do Sul. Borba pode ser considerado um dos pais dos geoparques da região, pois foi ele que, em 2009, participou de um evento e ficou sabendo da possibilidade de transformar a região em um geoparque, para valorizar e preservar suas riquezas geológicas, arqueológicas, paleontológicas e culturais. Desde então, seguiu numa luta incansável. Geólogo, ele plantou uma semente ao dar a ideia para as universidades e a prefeitura de Caçapava.


—  Em 2013, começaram as tratativas entre UFSM, Unipampa e Prefeitura Municipal para o reconhecimento de Caçapava do Sul como "capital gaúcha da geodiversidade", o que realmente aconteceu. Para celebrar esse reconhecimento, foi lançada a ideia do "geodia", um dia para aproximar a comunidade local do conhecimento geocientífico. Este evento, em 2023, já está em sua nona edição, e vai se transformar em um "Festival do Geoparque" para celebrar a conquista. Esses, basicamente, são os embriões do Caçapava Geoparque Mundial da Unesco — explica Borba. 


Cronologia 

  • 2009 - Pesquisador André Borba, da UFSM, participa de um evento internacional e fica sabendo da existência dos geoparques da Unesco. A partir daí, lança a semente do que acabou sendo o embrião do atual geoparque Caçapava
  • 2010 - Começaram os primeiros estudos com foco na geodiversidade do local, devido às formações rochosas de Caçapava, que são únicas no mundo, e uma referência para estudos de geólogos do mundo todo
  • 2013 - Começam as tratativas entre a UFSM, a Unipampa e a prefeitura de Caçapava para o reconhecimento do município como "capital gaúcha da geodiversidade"
  • 2015 - Aprovação do reconhecimento pelo Plenário da Assembleia Legislativa do Estado. Também iniciou o projeto "geodia"
  • 2018 - Apresentação do "Projeto Geoparque Caçapava" pelo professor André Borba
  • 2020 - Envio da carta de intenções à Unesco
  • 2021 - Submissão do Dossiê de candidatura a Geoparque Mundial da Unesco 
  • 2022 - Avaliação da Unesco, com visita de avaliadores em Caçapava
  • 2023 - Certificação como Geoparque Mundial da Unesco


O que é um Geoparque?

  • Os geoparques são territórios (regiões) de um ou mais municípios, reconhecidos como regiões que possuem importância científica, cultural, paisagística, geológica, arqueológica, paleontológica e histórica únicas. Há vários geoparques nacionais, mas somente 5 no Brasil são reconhecidos mundialmente, pela Unesco
  • Nesses locais, a Memória da Terra é preservada e utilizada de forma sustentável para gerar desenvolvimento para a sua comunidade
  • Um geoparque é composto por vários geossítios, que geralmente são pontos turísticos, como um mirante em uma montanha, uma formação rochosa rara, como a Pedra do Segredo, em Caçapava do Sul, ou um centro de pesquisa e exposição de fósseis, como o Cappa, na Quarta Colônia, onde podem ser vistos os fósseis dos mais antigos dinossauros do planeta
  • Com os 18 novos geoparques mundiais que receberão o certificado da Unesco, a entidade passará a reconhecer 195 geoparques em mais de 40 países
  • No Brasil, serão 5 geoparques Unesco: Araripe (Ceará), Seridó (Rio Grande do Norte), Caminhos dos Cânions do Sul (entre Rio Grande do Sul e Santa Catarina), Quarta Colônia e Caçapava do Sul


Grupo Diário no Marrocos

Uma comitiva brasileira com 40 autoridades está no Marrocos para o evento. Entre elas, o vice-governador Gabriel Souza (MDB), prefeitos da região, representantes da UFSM e de outros geoparques do país. Os repórteres Deni Zolin e Gilberto Ferreira participam da comitiva. O Grupo Diário é o único veículo de comunicação do Brasil inscrito na Unesco para cobrir o evento em Marrakech.


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Eduarda Paz

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